Pensados, ditos e escritos.

sábado, março 10, 2007

Tardes de Quinta-feira

A gente formiga em enchente até à rua.
Porra para a música! Os índios ainda a ver se enganam quem passa.
Tocam tão bem que até com as flautas no saco a xaranga continua!
Maquilho-me com sorrisos para distribuir na passadeira às almas que param por mim (eu não parava, por este mim não).
Eles devolvem-me uns verdadeiros.
É incrível como até aqui a corrupção chega. Sorrisos amarelos de bolor por sorrisos sinceros.
Sinto-me mal com o meu papel, ou a falta dele. No fundo acho é medo de me ligar e deixar entrar.
Abro os olhos, tanto que choro com as alfinetadas do vento frio, para te encontrar.
E tu nada. Indiferente.
Desapontas-me em cada carro onde não passas, em cada aceno que escondo, porque não estás lá.
Quem és tu?
A Lua vai alta, na cidade que flui vazia, a caminho de casa.
Entrei e fechei bem a porta, não fosse o vácuo seguir-me cá para dentro.

Carta a _______ (preencha os espaços)

Sabes, meu amor, aqueles dias em que queremos saltar mas não podemos? Estremecemos e controlamos o impulso no último segundo, por causa do risco.
A coragem não é desatada por razões frias que enlouquecem.
E é mesmo daquilo que estamos a precisar, e é mesmo aquilo que queremos. Mas não pode.
Há a minha vontade, mas não podemos.
E pronto. Temos que calar o salto, amarrar o grito que ia ser e deixar cá fora um eco de expectativas frustradas a vibrar o ar num silêncio ensurdecedor.
E tu aí tão perto. Mas não. Golpeaste-me sem saber e eu calado, sem mostrar. E tu ali, e eu aqui, e no meio uma parede de ar de aço, que não me deixa passar para aí, nem deixa passar sem ti.
Ensandece-me cada vez que me passeias clandestinamente pelo pensamento. Sou o guarda, atormentado por não poder querer deixar.
Já não posso de não poder querer(-te) tanto…
Continuo a estremecer, a calar, a agarrar uma pilha de nada, para iludir a tua presença ausente.
Talvez o medo me silencie, talvez a razão, não sei.
Sei que ter-te tão perto me seca e dá vida, num paradoxo inexorável.
Caio para cima, em torvelinho, por esse poço horizontal, à espera de um tecto onde aterre, mais ou menos incólume.Por favor, não vás, a tua inspiração consola-me o grito não sido.

Abraço

Era Madrugada.
A luz amarelada dos candeeiros da rua esgueirava-se pelos espaços entre os cortinados, coada pela sua transparência protectora.
Levantei-me, devagarinho, com todo o cuidado do mundo para não fazer barulho nem fazer tremer a cama.
Os lençóis descansavam de uma noite mutuamente amada, e envolviam o teu corpo como suaves ondas numa praia.
Tu dormes, calma, descansada, bela, no teu pijama improvisado. A camisola amarela, enorme, tem-te lá dentro, e o desenho branco na frente sobe e desce sobre ti, ao ritmo cadenciado do doce ar que respiras.
O cabelo solto sobre a cara torna-te mística, deitada numa cama moldada a nós que tentas agora ocupar.
Tive que sair mais cedo, antes de ser tempo de ir.. Ambos nos sentimos injustiçados por esta imposição.. queremos mais, muito mais...
Preparei-me e arranjei tudo o que precisava para levar.
Depois, parei e olhei para ti.
És linda!
Nesse momento lembrei-me de quando nos conhecemos, e da maneira alucinada e de rompante como entraste na minha vida, me cativaste, me abriste as portas ao Mundo e depois me arrancaste de mim para fora.
És tudo, tudo o que realmente importa.
Baixo-me até ao teu sono repousante e dou-te um beijo de despedida.
Semi-acordada passas-me o braço pelos ombros, puxas-me para ti e murmuras um”tem cuidado.. Boa viagem, até amanha” enrolado num beijo de resposta.
O meu corpo sai, só, enfrentando o frio da madrugada invernal que me espera lá fora..
Mas eu fico ali, contigo...
Mais um beijo e parto,
enquanto te abraço nesse sítio onde a noite é só nossa...

para ti II

Agarra-me a mão , vamos?

Damos voltas por sítios onde ninguém parece passar

Onde tempo corre e nós não damos por ele.

Leva-me contigo, e deixa-me estar.

Abraça-me ao luar, ao por ou ao nascer do sol.

Deixa-me estar !, onde quer que estejas.

Preciso da tua atenção, preciso da tua mão!

Guia-me, faz-me festas, põe a mão no meu cabelo.

Fica à minha espera, fica para sempre.

Eu espero por ti

Prometo-te isso.

Tens todo o tempo do mundo, eu vou estar sempre aqui

Pronto para te dar a mão, um abraço ou um beijo. Posso?

Diz-me que posso, e mergulha comigo numa alegria indizível.

Onde o medo não existe, onde as metas não existem

Onde a única coisa que existe é o brilho do nosso olhar.


Luís Bessa Monteiro

para ti I

Quero saber o que fazes agora

Quero saber com quem estás.

Quero mas não quero

Não me quero (des)iludir,

Não te vou deixar sair da minha mente,

Vou ficar para sempre com a tua cabeça no meu ombro

Vou ficar para sempre a tocar nos teus cabelos,

Como naquela noite em q sonhei contigo, lembras-te?

Claro q não, não te disse. E tu, já sonhaste comigo?

Sonha, uma vez que seja e diz-me.

Sossurra-me ao ouvido, dá-me a mão.

Assim partiremos para onde tu quiseres.



Luís Bessa Monteiro